Contos

Amor 288 (a arte imita a arte)

amor288O dono do Botequim Literário serve agora, o conto Amor 288, uma transformação da música Mesa de Saloon, da banda carioca Matanza, em literatura.

Você sabe o que é ficar 10 anos na prisão? Pois é, pouca gente sabe. Os bandidos profissionais ou fogem ou conseguem um bom advogado para tira-los de lá antes. Os pobres coitados não aguentam e morrem, suicídio ou assassinato mesmo.

Portanto, eu sou a coisa bizarra por aguentar todo esse tempo. Foram 10 anos na seca, longe da minha parceira. Muitos acham que eu deveria ter culpado por ficar atrás das grades. Não! Ela fez bem em fugir naquele tiroteio. Se fosse o contrário, seria a mesma coisa.

No primeiro dia fora da cadeia, foi ela que eu encontro bem na porta a me esperar. Com um belo vestido, a minha morena dos olhos verdes estava com um conversível ligado, que acabara de roubar.  Saimos juntos, após 10 anos, para festar e comemorar.

Paramos em um mercadinho de beira de rodovia e compramos cigarros e uma garrafa de Gim. Não perguntei o que ela fez durante os 10 anos. Não importava, pois estávamos recomeçando a nosa história. Sabia que ela tinha ficado com todo o dinheiro daquela vez, o que disperasia novos confrontos, dignos de filmes de bang-bang.

Erro meu! Erro, aliás, que poderia ter percebido. Ora, porque diabos ela ia querer entrar naquele hotel no início da tarde? Pediu para eu ficar no carro e disse que voltaria logo. E voltou mesmo, correndo de um tiroteio e jogando um saco de dinheiro no banco de trás. Entrou no carro, pisou fundo até sermos despistados. O destino de novo me enganou, pois o meu primeiro dia livre começou comigo em fuga outra vez.

Foram cinco horas pisando fundo na rodovia. Perguntava porque precisara fazer isso de novo, mas ela só respondia uma coisa “calma meu amor, eu logo de explico”. No final da tarde, o por-do-sol fazia um contraste com a sirene da polícia, que vinha atrás de nós. Ela ignorava todos os tipos de riscos e continuava pisando fundo.

O cerco policial foi aumentando e a situação foi ficando mais feia. Só parávamos para comprar comida e ir ao banheiro. Eu apagava dentro do carro mesmo e ela já estava quatro dias sem dormir. Mesmo com a notícia no rádio, que a polícia nos esperava na próxima cidade, fechando o cerco, ela continua sorridente e confiante.

Um motociclista se aproximou do carro e avisou que dois quilômetros a frente, as viaturas oficiais nos esperavam. Seria o fim. Após 10 anos preso, voltaria para as grades em menos de uma semana. E pior, não havia feito NADA! Precisava tomar alguma atitude.

Passando por um posto de gasolina, em meio a um vazamento na tubulação de gás, resolvi agir. Sabia que ia sentir saudades daqueles olhos de menina, mas deixei a ponta do cigarro acesa voar. O meu relógio no minuto em que parou, foi achado tão longe de onde estou. Com ela em paz, sem mais ninguém.

Foi numa mesa de bar que a conheci e no meio do saloon me apaixonei. Mas eu sempre soube que com ela eu não conseguiria mais viver dentro da lei.

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